PARTE A: HISTÓRIA PREGRESSA

A história da hipnose, na realidade, iniciou-se antes da existência de qualquer relato escrito da história humana. Nas cerimônias religiosas e de cura de todos os povos primitivos que já habitaram este planeta existem elementos essenciais para induzir seus participantes em transe hipnótico. Assume-se, portanto, pelo estudo das cerimônias de povos primitivos ainda existentes na África, na Austrália e em outros lugares, que, mesmo antes da história começar a ser gravada, as induções eram realizadas através de cantos rítmicos, batidas monótonas de tambores, juntamente com o olhar fixo dos olhos acompanhado de catalepsia do resto do corpo.
Tais cerimônias primitivas tinham como ponto essencial o foco central da atenção, com áreas neurológicas vizinhas de inibição, sendo estes dois fatores responsáveis por 95% da indução do transe hipnótico. Na realidade é sem importância que estas cerimônias sejam chamadas de religiosas, curandeirismo ou uma combinação de ambas. O fato é que o estado de transe existia e seu caráter era hipnótico, apesar de que a palavra "hipnose" jamais fora aplicada a ele antes de Braid cunhar o termo em 1842.
Todos aqueles que viajam através do mundo estão familiarizados com indús, faquires, iogues, encantadores de serpentes, e adeptos da Magia no ocidente que induzem em si e em outros, estados catalépticos através da fixação dos olhos e de outras técnicas de mesmerismo, capazes de realizar proezas físicas e de eliminar a dor.
Um incidente interessante foi relatado por James Esdaile, autor de Hypnosis in Medicine and Surgery, onde descreve um método para se produzir anestesia usado por um famoso mago oriental da época: "9 de Junho de 1845 – Hoje tive a honra de ser apresentado a um dos mais famosos magos de Bengala, que desfruta de grande reputação devido ao seu tratamento eficaz da histeria, e que havia sido chamado para prescrever para meu paciente (cujo caso será explicado depois), mas chegou muito tarde; pois com o sucesso do meu encantamento (Mesmerismo), nada restou para ele fazer. Baboo Essanchunder Ghosaul, deputado magistrado de Hooghly, a meu pedido, apresentou-me a ele como um irmão mago, que havia estudado a arte da magia em diferentes lugares do mundo, mas particularmente no Egito, onde eu havia aprendido os segredos do grande Soolevmann, com os mulás e os faquires, e que eu tinha o grande desejo de comprovar se nossos encantamentos eram os mesmos, pois os maometanos da Europa estimavam muito os homens sábios do oriente, sabendo que todo conhecimento havia ali se originado. Eu sugeri que devíamos mostrar nossos encantamentos um ao outro, e, após convencê-lo, ele concordou em mostrar-me seu processo de alívio da dor. Ele pediu um pote de metal contendo água e um pequeno galho com duas ou três folhas, e começou a resmungar seus encantamentos, à meio metro de distância do paciente. Logo depois, ele mergulhou seu dedo indicador na água, e, com a ajuda de seu polegar, jogou pingos no rosto do paciente. Ele então pegou as folhas e começou a bater na pessoa do topo da cabeça até os dedos dos pés, com um vagaroso movimento no ar. As articulações de seus dedos quase tocavam o corpo do paciente, e ele disse que continuaria com este processo por uma hora ou mais se necessário. E isto me convenceu de que estes encantadores, quando quer que tenham sucesso com estes meios, este é devido à influência mesmérica, provavelmente desconhecida para eles mesmos. Eu disse que estava convencido da grande eficácia de seu encantamento, e que agora lhe mostraria o meu, mas que ele o compreenderia melhor se realizado em sua própria pessoa. Depois de alguma dificuldade, conseguimos fazer com que ele se deitasse e encarasse meus procedimentos com a devida solenidade. Eu cantei, como uma invocação, o coro de"Kings of the Cannibal Islands"! Eu queria que ele fechasse seus olhos, e ele apertou suas pálpebras firmemente, para que eu não achasse a entrada para o cérebro através daquele orifício. Depois de quinze minutos ele deu um pulo, dizendo que havia sentido algo desagradável vindo por cima de si, e quis escapar. Entretanto, ele foi novamente persuadido a se deitar, e logo vi os músculos em volta de seus olhos começarem a relaxar e seu rosto tornou-se perfeitamente suave e calmo. Eu estava certo de que havia pego meu irmão mago tirando uma soneca, mas, depois de alguns minutos, ele levantou-se repentinamente, juntou as mãos na cabeça gritando que se sentia embriagado, e nada podia induzi-lo a se deitar novamente: "abiit, excessit, evasit, erupit!". No dia seguinte, eu o encontrei e disse: "Bem, na última noite você foi muito forte para meu encantamento, e não consegui fazer você dormir"."Oh! Sim, Sahib", respondeu, "Você conseguiu; eu permiti; é permitido que você me faça dormir".
Tal como Moll observou, estes fenômenos hipnóticos também são constatados como tendo existido há vários milhares de anos entre os Magos da Pérsia, até a presente época entre os iogues e faquires da Índia.
O mais antigo relato registrado de curas através da hipnose foi obtido nos Papiros de Ebers, os quais nos dá uma idéia a respeito da teoria e prática da medicina egípcia antes de 1552 A.C.. Nos Papiros de Ebers é descrito um tratamento no qual o médico colocava suas mãos sobre a cabeça do paciente e, afirmando possuir poderes sobre-humanos de cura, recitava estranhos mantras terapêuticos que eram sugeridos aos pacientes, resultando em cura. O Rei Pyrrhus do Egito, o Imperador Vespasiano, Francis I da França e outros reis franceses até Charles X, praticavam a cura dessa maneira.
Acredita-se que os egípcios tenham sido os criadores dos "Templos do Sono", nos quais os sacerdotes administravam tratamento similar em seus pacientes através do uso da sugestão. Estes templos tornaram-se muito populares no Egito, espalhando-se posteriormente para a Grécia e Ásia Menor.
É sabido que Hipócrates, o médico grego mais frequentemente citado como o "pai da medicina", e cujo juramento é feito por todos os médicos ao se formarem, discutiu o fenômeno afirmando que "a aflição sofrida pelo corpo, a alma enxerga muito bem com os olhos cerrados".
Os romanos tomaram emprestado dos gregos a cura pelo transe, bem como diversos outros aspectos da cultura grega, durante o período do grande Império Romano. Muitos homens de grande sabedoria foram trazidos da Grécia como escravos para ensinar os jovens romanos. Entre os romanos, Esculápio costumava induzir seus pacientes a um "sono profundo", aliviando a dor através de leves pancadas com sua mão.
O advento do Cristianismo tem muito a ver com o declínio da hipnose e da cura através do transe, porque a hipnose passou a ser considerada uma prática de feitiçaria, e a cura através do transe, quando praticada, era cercada de todo segredo possível. Todavia, apesar disto Jesus empregou a hipnose para realizar vários de seus milagres. Uma completa discussão desse assunto é encontrada no meu livro Religious Aspects of Hypnosis, publicado em 1962 por Charles C. Thomas and Co., Springfield, Illinois.
No século X, Avicenna, um grande médico árabe, afirmou: "A imaginação pode fascinar e modificar o corpo de um homem, tornando-o doente ou restaurando-lhe a saúde".
Por volta da metade do século dezesseis, um homem chamado Theophrastus Paracelsusexpôs uma nova teoria a respeito da produção de doenças. Esta teoria afirmava que certos corpos celestes, especialmente as estrelas, influenciavam o comportamento dos homens. Ele também postulou que os homens influenciavam uns aos outros, preceito este que ainda é um conceito básico no estudo da "psicologia do comportamento".
Van Helmont, Maxwell da Escócia e Santanelli da Itália, afirmaram praticamente a mesma coisa por volta do ano de 1600, estabelecendo a fundação para o conceito do magnetismo animal, que mais tarde seria tornado famoso por Mesmer. É possível provar que quase toda civilização antiga estava familiarizada, de uma forma ou de outra, com a hipnose. LeCron lembra que está descrito em alguns Mantras indianos, escritos em caracteres antigos, que os mongóis, os tibetanos e os chineses possuíam o conhecimento da hipnose, e que até mesmo uma descrição detalhada do assunto é dada no Kalevala, o grande poema épico dos finlandeses

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