Hipnoterapeuta põe transe no divã

A hipnose é uma ferramenta terapêutica que ajuda o paciente a reduzir sintomas de depressão e ansiedade especialmente nos casos de transtorno do pânico, fobia social e fobias específicas. Mas sua eficácia depende de um elemento ético do terapeuta: ensinar o paciente a realizar o que os especialistas chamam de auto-hipnose. Ou seja, após ser submetido à terapia, o paciente deve ser treinado a realizar sozinho o controle dos seus sintomas através da auto-hipnose.
A afirmação é do psicólogo Benomy Silberfarb, psicoterapeuta especialista em hipnoterapia cognitiva. Ele esteve em Bauru ministrando curso para profissionais na área e falou, sem tabus, sobre os melindres, a “propaganda” irregular em relação ao uso da hipnose e os conceitos sobre sua aplicação. Do ponto de vista dos especialistas, vale ressaltar que pânico e fobias são subtipos de manifestação dos transtornos de ansiedade.
Ao pé da letra, Benomy sintetiza que a hipnose não cura, mas potencializa os resultados terapêuticos diminuindo o tempo de tratamento. Ele critica o uso do processo por hipnotista(é quem faz um cursinho de fim de semana e sai hipnotizando pessoas) em casos de depressão e ansiedade, que devem ser tratados somente por formados em psicologia e psiquiatria.
Outro elemento essencial da questão é a indução de “falsas memórias” ao paciente durante a regressão de memória, quando esta é indicada. A sugestão de frase pelo terapeuta experiente deve mirar a indução neutra ao “acessar” checagem sobre a ocorrência ou não de violência sexual ao paciente quando garoto, por exemplo. Mas esse discernimento depende de experiência, habilidade e conhecimento pelo hipnoterapeuta. Leia os principais pontos da entrevista concedida ao Jornal da Cidade:
- Há comparação da hipnoterapia cognitiva com o método clássico de hipnose?
Benomy Silberfarb -
A diferença é que sou psicólogo especializado em hipnoterapia comportamental e não sou hipnotista e, com isso, pude estudar e levar para o consultório a compatibilidade que a hipnose tem, e tem literatura acadêmica inclusive pra isso, com a terapia cognitiva. É uma parceria terapêutica entre esses dois elementos. Estou falando de uma abordagem com consistência em uma corrente psicológica e não a prática do hipnotismo. E vale dizer que é exercício ilegal da profissão usar hipnose para tratar depressão e ansiedade e outros transtornos quem não seja psicólogo e psiquiatra, como ocorre com pessoas que se apresentam como hipnotistas. Agora usar a hipnose para ver dor de dente, unha encravada é outra coisa. 
  - Na terapia cognitiva a abordagem do paciente é realizada de forma consciente. E na hipnoterapia cognitiva?
Benomy -
Para o terapeuta cognitivo não existe o inconsciente. Existe o que seria o inconsciente cognitivo, que seria um depositário de memória, compulsões e esquemas mentais que são ativados em determinados momentos, ligados a algumas emoções. Nem tudo na terapia cognitiva se resolve e nem tudo na hipnoterapia cognitiva se resolver sem a terapia cognitiva. É uma ferramenta terapeuta complementar. Aliás, inconsciente é o nome de uma área que a psicanálise se apropriou para demonstrar um território onde nunca houve comprovação científica da existência dele.
  A hipnose acessa o chamado inconsciente?
Benomy -
Eu não acredito que a hipnose acessa o inconsciente. O que a gente acessa, de fato, é uma área no cérebro em que todos os esquemas mentais estão presentes e são construídos pelos valores que o indivíduo adquiriu da infância, do ambiente, e que nos alimentam com um conjunto de crenças e são essas crenças que vão formando os esquemas mentais que são ativados. A hipnose entra na capacidade de produzir o processo chamado de hiperamnésia. É a capacidade de acessar memórias que tem muita dificuldade de vir à consciência. No transe hipnótico o cérebro se abre para algo com percepção real. Por exemplo, o pesadelo. Acuando você tem um pesadelo você acorda à noite muitas vezes muito agitado em função daquilo que você usou da imaginação. Mas o pesadelo é mentira. Mas o seu cérebro acreditou como tal. Na hipnose acontece a mesma coisa. Inconsciente é uma área apropriada pela psicanálise para determinar um território onde não há comprovação científica da existência dele. Respeito muito tudo isso, mas o que houve foram expressões filosóficas como ego, super ego, apresentadas para falar a respeito. A terapia cognitiva por sua vez é de técnica e de evidências científicas. Mas, apesar disso, o preconceito continua com a hipnose. 
  - E como esse processo de acesso a memórias ou esquemas mentais pode ser acessado?
Benomy -
Nós produzimos cenários, ou buscamos cenários já existentes, para trabalhar em cima desses cenários as emoções. Eu posso investigar um estado desadaptativo da infância, por exemplo, colocando o paciente em transe hipnótico e pedindo para que ele experimente, me diga e valide aquela emoção que em uma psicoterapia tradicional está difícil. Então a hipnose vem completar coisas que nós, dentro da psicoterapia, não conseguimos lidar como acessar uma emoção muito particular, ou especial, que, conscientemente, o paciente não acessa, como um trauma.
  - O terapeuta trabalha nos registros de emoções como se reformatasse, como no HD do computador, o que está lá?
Benomy -
Exatamente. Só que nós estamos trabalhando para gerar um HD novo. Porque quando o paciente sai de um processo de hipnose ele sai como seu próprio hipnoterapeuta. É a auto-hipnose. O que o terapeuta faz, ele junta o aprendizado da psicoterapia com as técnicas que ele aprende para o controle de ansiedade, de compulsões, de peso, para mudar comportamentos em função de um gatilho que nós colocamos na hipnose. São múltiplas as aplicações. A grande vantagem que a hipnose oferece, diferente da psicoterapia, é acessar algo muito traumático e manter o paciente muito relaxado. Na psicoterapia você não consegue fazer isso, porque o paciente vem muito ansioso.
  - Se o terapeuta der uma sugestão equivocada o paciente não a recebe, não realiza?
Benomy -
Não realiza. Claro é uma relação de confiança e isso faz a diferença para a realização da hipnoterapia cognitiva. Trabalhei com atletas de ponta nos EUA a técnica de visualização mental para que esses atletas alcançassem outros patamares de performance com o corpo. E todos somos capazes de alcançar isso. A hipnose consegue fazer você fazer um pouco mais. No estado fora da hipnose a pessoa faz juízo das coisas e por isso não se permite, não realiza. Se eu pedir para você tirar toda a roupa, você não vai tirar. Mas como paciente, preparado, se você acredita no terapeuta, a sugestão dada ao paciente entra como uma crença e ele realiza sem fazer juízo, apenas acredita e faz. E detalhe, a acuidade mental dentro da hipnose é muito maior. Você ouve mais, cheira mais, toca mais, percebe mais. Mas isso tudo é feito de forma consciente pelo paciente, reforço. Só que o paciente não julga e não critica.
  - Mas o que você diz a respeito das críticas de que a hipnose não gera resultado permanente, a sugestão ou ressignificação mental se perde?
Benomy -
Primeiro, tem paciente que não tem indicação para hipnose. Então usa a terapia cognitiva e acabou. A hipnose trata sintomas, de raiva, impulsividade, insônia, etc. Pra mim a hipnose é ferramenta para trabalhar ansiedade basicamente. Não conheço na minha vida algo tão rápido, que baixe os sintomas da ansiedade em 10 segundos. Agora ela é permanente porque o paciente aprende a auto-hipnose. Se você é um mau profissional, sem ética, você não vai ensinar isso pro paciente pra ele voltar e você faturar. Mas se você é profissional ético, você faz a terapia com o paciente e ensina depois ele a promover o autocontrole, o auto monitoramento em casa para o resto da vida. A auto-hipnose é o que mantém o processo depois, até entrar no fenômeno de habituação comportamental.
  - Então a hipnose não cura, ela promove o controle de uma fobia, por exemplo?
Benomy -
A pessoa é treinada a se habituar a mudar o comportamento e a controlar ou monitorar a questão que lhe incomodava. Com isso, a hipnose controla ansiedade, promove sugestão que faz o obeso emagrecer e é espetacular na atividade física. Você produz triptofano que é a base da serotonina, você produz prolactina que é um hormônio que relaxa você demais com o uso da hipnoterapia. A compulsão por exemplo é um comportamento não pensado. Se você controla isso e pensa, você não repete a compulsão ao comer.  
Entenda mais 
A hipnoterapia cognitiva é um processo terapêutico pelo qual o profissional se utiliza da hipnose clínica (clássica) como ferramenta na psicoterapia cognitivo-comportamental.
A intervenção comportamental objetiva aliviar o paciente do sofrimento através de técnicas de relaxamento e respiração inerentes às técnicas de indução. A intervenção cognitiva visa, pelo menos, colocar em dúvida crenças limitantes.
Segundo os especialistas, a hipnoterapia cognitiva apresenta ótimos resultados contra sintomas da ansiedade, na ressignificação de memórias, no tratamento da depressão e no tratamento de fobias.
A hipnose clínica é um processo totalmente consciente, no qual o paciente atinge estado de relaxamento profundo e extremamente prazeroso e, através de processo de hiperamnésia, o acesso às memórias de difícil acesso pela consciência é facilitado. As respostas de relaxamento e de ansiedade são incompatíveis. Portanto, a intervenção promove as condições necessárias para a nova aprendizagem.
O campo de atuação também se estende no manejo da dor, da insônia, do estresse, do hábito de roer unhas, contra o zumbido intermitente, a fibrobialgia, as disfunções sexuais de fundo emocional, os tiques, a compulsão alimentar específica e os medos - como de elevador, de dirigir, de voar de avião, de altura, entre outros.
Todas as pessoas podem ser suscetíveis ao processo e para isto é fundamental que haja permissividade do paciente e confiança no terapeuta.

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